Samba & Sol: quem lucra com o Brazilwashing?
Todo mundo ama o Brasil, ou, os likes que vêm dele.
Uma das atividades preferidas das estrangeiras que visitam o Brasil é customizar Havaianas com PINS. Os vídeos de meninas até então desconhecidas, escolhendo a cor de suas “flip-flops” ultrapassam facilmente 500k visualizações.
Ao entrar nos comentários, uma surpresa: quem aplaude e se interessa por esse conteúdo, são os próprios brasileiros. Endossando as escolhas e dando dicas para as recém-influencers, que continuam a produzir conteúdos sobre o país.
Somos um dos países que passa mais tempo online. Temos 89% dos usuários de internet no Instagram e 65% no Tiktok. A presença massiva de brasileiros nas redes sociais pode ser o começo da explicação desse fenômeno, que vou chamar de “brasilidade global”.
Em agosto de 2023 a Vogue Hong Kong lançou a matéria “All You Need To Know About Brazilcore”, explicando todos os códigos da tendência que estava viralizada no Tiktok e envolvia camisetas de time e muito verde e amarelo. Em agosto de 2024 a Glamour trouxe as últimas tendências da semana de moda de Copenhague, eram Havaianas marrons. Em novembro de 2024 o cantor Bruno Mars lançou um clipe cantando funk e passeando pela cidade de São Paulo em seu Instagram, e já tem mais de 10 milhões de curtidas…
O Brasil é o momento. Mas, será que é uma paixão repentina pela nossa cultura e “exoticidades”, ou pelos views que podemos proporcionar?
A “brasilidade global” também pode ser observada se você segue Youtubers ou Tiktokers estrangeiros. Casualmente, eles passaram a mencionar os brasileiros de alguma forma. Fazem vídeos provando comidas brasileiras, reagindo às músicas, tentando dançar. O @edpeople é um Tiktoker famoso por viajar pelo mundo e pedir que as pessoas ensinem “seu passo de dança favorito”, enquanto na maioria dos países a média de visualização é de 140K, os vídeos do Brasil chegam facilmente em 840K.
Recentemente, um funk do Dj Arana também virou thread: alguns idols sul-coreanos, que tentavam reproduzir os movimentos da “dança do ombrinho”. Os brasileiros lotaram os vídeos de likes e comentários, fazendo boa parte dos coreanos adotarem a brincadeira para tentar a alcunha de micro-influencer.
Os influencers e produtores de conteúdo estrangeiros notaram que falar do Brasil engaja, gera likes e seguidores.
As marcas também.
Em 2023 tivemos o retorno do Adidas Samba. Uma chuteirinha, criada em 1950 para quem jogava futebol de salão. Em todos os continentes você consegue encontrar Clean Girls com seus coques perfeitamente alinhados, desfilando com o modelo.
E é em todos MESMO, tá? Tirei fotos de meninas da Espanha, Itália, França, Coréia e Japão em 2024.
Não sei se o ponto desse post já ficou claro. Mas popularizamos com uma CHUTEIRA, chamada SAMBA de uma empresa Alemã.
E ela não veio sozinha. Quem usa Adidas Samba, tem um cheiro específico.
A Sol de Janeiro foi fundada por uma coreana chamada Heela Yang (CEO), pelo veterano da indústria da beleza Marc Capra e para não ser totalmente injusta, tem uma brasileira criada nos EUA - Camila Pierotti, no time de fundadores.
Com produtos como:
Brazilian Bum Bum Cream. Beija Flor Elasti-Cream. Bom dia Bright Cream. Delícia Drench Body Butter. Carioca Crush.
A marca ganhou notoriedade. O primeiro sucesso, Brazilian Bum Bum Cream, se tornou viral nas redes sociais. O produto utiliza ingredientes tipicamente brasileiros como a guaraná e a manteiga de cupuaçu. A fragrância característica, inspirada nas praias do Rio de Janeiro, contribuíram para criar um produto """"""exótico"""""" no mercado internacional.
Em janeiro de 2022, a Sol de Janeiro foi adquirida pela L'Occitane International por aproximadamente US$450 milhões (Exame, 2023). A aquisição demonstrou o potencial reconhecido da marca no mercado global de beleza. Antes da aquisição, a marca já havia alcançado status de unicórnio, com avaliação superior a US$1 bilhão.
Me pergunto se algum brasileiro lançaria uma chuteira chamada Samba, ou um creme chamado BUMBUM Brasileiro. Estereótipos tão forçados, que provavelmente não avançariam num processo de brainstorm em alguma agência de publicidade da Vila Madalena.
Mas, se você tem alguma dúvida sobre a força desses clichês, olha essas buscas no Google Insights:
Primeiro, comparei o ADIDAS SAMBA com o clássico ALL STAR. Na sequência, o perfume Sol de Janeiro com o Chanel Nº5 (considero um dos perfumes mais icônicos).
Sem vieses de julgamento, mas vale a pena começar a pensar em “quem lucra”, sempre que começamos a consumir uma tendência, ou que espalhamos nossos LIKES e comentários por aí.
Beijos, do Brasil com S
No medo de cairmos em estereótipos com as marcas que trabalhamos aqui no Brasil, somos ultrapassados por marcas de fora usando nossos estereótipos.
Análise brilhante.
Acho interessante como a “brasilidade global” virou um baita atalho para as marcas e influencers. Pegue a Adidas, por exemplo, com a reinterpretação da Samba, ou a Sol de Janeiro com o “Bum Bum Cream”, que faz sucesso mundial. Esse tipo de estereótipo “exótico” tem um apelo irresistível.
Mas fico pensando, será que as marcas brasileiras, se fossem as criadoras dessas tendências, teriam o mesmo impacto? No final, quem realmente sai ganhando com esse fenômeno?